Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

sexta-feira, outubro 29, 2010

Roma e Haiti



A liberdade de pensar, a liberdade de culto, a liberdade, enfim, (o próprio livre arbítrio, que já deve estar gravado no inconsciente coletivo) fica estremecida sempre que um líder religioso faz declarações inoportunas. O Brasil é um Estado laico e demos graças a Deus por ter tirado dos Romanos, os poderes que há séculos atrás nos afligiram.
Que durma em paz, o bispo de Roma, no seu luxuoso palácio, ostentando sua força política, depois de reunir os bispos conservadores do Brasil.
Enquanto SS ressona com o código canonico à cabeceira, o cólera morbus devasta as crianças do Haiti. Que falta nos faz dona Zilda Arns! Vale mais uma Zilda, leiga, que mil bispos indiferentes diante da dor humana.

Abençoado seja quem separou Estado e Igreja!
Saúde e fraternidade a todos!

P. S.: como não é nosso desejo ferir os muitos amigos e irmãos católicos que temos, declaramos que não há aqui nenhum anti-clericalismo. Sou fã de Dom Hélder, Pe. Reginaldo Veloso, Irmã Dulce, Zilda Arns e Leonardo Boff. Também venero Maria e amo Jesus. Sei, no entanto, que eles jamais aprovariam o Santo Ofício, nem silenciariam a Teologia da Libertação, por exemplo. O que temo é a hipocrisia e a tentativa de desfazer o estado laico e plural, que conseguimos a preço de tantas mortes e privações. É isso!

segunda-feira, outubro 25, 2010

MATA-MOSQUITOS: essa palavra me calou fundo.





Corria o ano de 2002, quando eu encontrei, por acaso, o amigo cineasta Pedro Aarão,que, como sempre, pedalava sua bike pelas ladeiras do sítio histórico de Olinda. Ao me ver, deu aquela paradinha pra dois dedos de prosa. Entre uma e outra conversa sobre arte, poesia e cinema, perguntou-me sobre uma canção que eu fizera em parceria com o violinista Ariston Trajano, cuja letra homenageava um antigo documentário de sua autoria. Meu Deus, disse-lhe eu. Só quem tem essa letra é o Ariston. Vou tentar localizá-lo. Parece que está coordenando um Centro Social Urbano, lá pros lados do bairro de Casa Amarela.
O cineasta Pedro Aarão insistiu pra que o localizasse, pois que uma doutoranda argentina trabalhava em uma tese sobre seu filme, e a canção se encaixaria bem, naquele momento.
Dia seguinte, folheei a lista telefônica e logo encontrei o número do Centro Social. Mas ao ligar pro Trajano, recebi a terrível notícia, dada por um vigilante (era um domingo e não havia expediente):

-- Senhor, sinto muito lhe dizer, mas o nosso querido Trajano, nosso protetor e amigo dos mais humildes cá do Centro Social, faleceu há uns 3 meses, vitimado por seqüelas de uma dengue hemorrágica...

Por essa época, o Serra andava demitindo os mata-mosquitos do Rio de Janeiro, e em virtude disso, muitos jovens também estavam morrendo de dengue, naquele Estado; a doença estava se alastrando por todo o Brasil. Só o Serra não via isso!
Eu sinto no fundo da alma a dor daqueles que perderam os seus entes queridos, em virtude dessa doença terrível. E não posso esquecer que o cara de pau do Serra, Ministro da Saúde à época, lançou-se também candidato a Presidente, disputando com o nosso Lula, naquele ano de 2002.
Votei e elegi o Lula com muito orgulho. E com muita raiva do Serra.
Agora, quando escuto os rumores da revolta dos mata-mosquitos, abre-se-me no peito a mesma dor de 2002 e me solidarizo com a luta daqueles valorosos trabalhadores fluminenses. Aquela bolinha de papel representa a mais sincera rejeição por uma figura tão sinistra e abjeta. A ele devemos a perda de milhares de jovens, crianças e adultos, causada pela sua irresponsável política de saúde.

Abaixo transcrevo, trecho dos anais da Assembléia Legislativa, que homenageou o querido Ariston, vítima da incúria do atual candidato José Serra:


ANAIS DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
Requerimento Nº 3729/2002


Requeremos à Mesa, ouvido o Plenário e
cumpridas as formalidades regimentais,
que seja enviado um Profundo Voto de
Pesar pelo falecimento do Sr. ARISTON
TRAJANO DO NASCIMENTO - TRAJANO
DO BRASIL.
Da decisão desta Casa, e do inteiro teor
desta proposição, dê-se conhecimento e
Esposa Betânia Vítor do Nascimento, ao
Filho Emanuel Nascimento; à Mãe
Teresinha de Jesus do Nascimento, com
endereço na rua professor José Amarino
dos Reis, 2367 - Bomba do Hemetério,
Recife/PE; ao Ilmo. Sr. Pressente da
FEMEB, Amaro da Silva, com endereço
rua Natividade Saldanha, 410 - Torreão -
Recife - PE; ao Ilmo. Sr. Ronaldo
Agostinho de Silva, com endereço na Rua
Santa Izabel, 880 - Alto Santa Isabel -
Casa Amarela - Recife - PE - CEP: 52070-
240, ao Ilmo. Sr. José Maria Martins de
Silva, com endereço na Av. Norte, 5969 -
Apt. 11 - Bl. A - 1º andar - Casa Amarela -
Recife - PE; ao Ilmo. Sr. João Cavalcanti
das Neves, com endereço na Rua Três de
Maio, 58 - Várzea - Recife - PE - CEP:
50731-020; ao Ilmo. Sr. Antônio da Silva
Machado, com endereço na Rua Velha,
122 - Boa vista - Recife - PE - CEP: 50060-
270; ao Ilmo. Sr. Antônio José de Melo
Filho, com endereço na Rua Araripe
Júnior, 39 - Córrego do Genipapo - Recife -
PE - CEP: 52091-021 e ao Ilmo. Sr. Wilson
Sabino, com endereço na Rua Caburaí,
230 - UR-7 - Várzea - Recife - PE - CEP:
50860-220.
Justificativa
O Sr. Ariston Trajano do nascimento, que
tantos amigos tinha no nosso Estado,
faleceu, vítima de deficiência respiratória,
no dia 16 de fevereiro de 2002, aos 37
anos, deixando esposa e filho e um legado
insubstituível de integridade e coragem.
Trajano do Brasil como era chamado por
seus entes queridos e colegas de trabalho,
deixa uma lacuna que jamais será
preenchida por qualquer outro.
A sua partida entristeceu a todos, mas
deixa a imagem da sabedoria do um
homem que soube valorizar o amor ao
próximo antes de todas as coisas.
Portanto, nada mais justo do que esta
Casa Legislativa apresentar votos de
profundo pesar pela perda repentina do Sr.
ARISTON TRAJANO DO NASCIMENTO -
TRAJANO DO BRASIL.
Ante o exposto, solicito dos meus ilustres
pares aprovação para este Requerimento.
Sala das Reuniões, em 16 de abril de
2002.
Augusto Coutinho
Deputado




Ao amigo e parceiro Ariston, minha saudade e minha homenagem.

P. S.: perdoem-me os senões deste texto. Passei dias engasgado com essa dor e só hoje tive ânimo para lembrar desse fato. Vai assim mesmo, meio arrastada do fundo do peito, com um nó na garganta e com muita náusea de ver pela TV, a cínica face desse Sr. Serra, representante da hipocrisia e da farsa política no Brasil.

sexta-feira, outubro 15, 2010

Marinei, sim, mas voto 13 !!!

Um dia eles saberão que um pacto federativo se faz
com crescimento equilibrado de todas as regiões do Brasil.
E que isso, se feito há 5 décadas atrás, teria evitado
a grande migração nordestina para o sul/sudeste
e o inchaço monstruoso de Sampa.
Agora, com as cidades litorâneas sitiadas pelos retirantes
fugidos dos intermináveis ciclos de seca e de fome,
surgem os que querem mudar esse cenário:

Água, luz, agricultura familiar, ferrovias,
escolas técnicas, agrícolas, universidades no interior.

Eis o legado dos últimos 8 anos.
O cenário mudou
e deverá seguir mudando,
pela força do povo nordestino
e para o bem de toda a nação brasileira!
O nordeste não se deixará iludir pela prestidigitação
da mídia farisaica.
Como diz minha amiga Mai:
"a fome é laica".


E o voto é 13!



Imagem google:
Transposição das águas do São Francisco
Leiam aqui sobre o sábio voto do Nordeste.

quarta-feira, outubro 06, 2010

LIRISMO POLÍTICO (um pouco de ar puro)





Aos amigos virtuais ou não:

Cansei de eleições, mas não de política. Por isso aí vai mais uma charada lírica. Decifrem-na. É tão lugar-comum, que muitos olhos já não a percebem. Mas, lembrem-se: olhos de criança, por favor. rsrsrs


Capítulo XXI



E foi então que apareceu a raposa :

- Bom dia, disse a raposa.

- Bom dia, respondeu polidamente o príncipezinho, que se voltou, mas não viu nada.

- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira...

- Quem és tu ? Perguntou o príncipezinho. Tu és bem bonita...

- Sou uma raposa, disse a raposa.

- Vem brincar comigo, propôs o príncipezinho. Estou tão triste...

- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. Não me cativaram ainda.

- Ah! Desculpa, disse o príncipezinho.

Após uma reflexão, acrescentou :

- Que quer dizer « cativar »?

- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras ?

- Procuro os homens, disse o príncipezinho. Que quer dizer « cativar »?

- Os homens, disse a raposa, têm fuzis e caçam. É bem incômodo ! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que eles fazem. Tu procuras galinhas ?

- Não, disse o príncipezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer « cativar »?

- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa « criar laços... »

- Criar laços ?.

- Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...

- Começo a compreender, disse o príncipezinho. Existe uma flor... Eu creio que ela me cativou...



- É possível, disse a raposa. Vê-se tanta coisa na Terra...

- Oh! Não foi na Terra, disse o príncipezinho.

A raposa pareceu intrigada :

- Num outro planeta ?

- Sim.



- Há caçadores nesse planeta ?

- Não.

- Que bom ! E galinhas ?

- Também não.

- Nada é perfeito, suspirou a raposa.

Mas a raposa voltou à sua idéia.

- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...

A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe :

- Por favor... Cativa-me! Disse ela.

- Bem quisera, disse o príncipezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.

- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me !

- Que é preciso fazer? Perguntou o príncipezinho.

- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal entendidos. Mas, cada dia, te sentará mais perto...

No dia seguinte o príncipezinho voltou.

- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta a agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos.

- Que é um rito ? Perguntou o príncipezinho.

- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias !

Assim o príncipezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou à hora da partida, a raposa disse :

- Ah ! Eu vou chorar.

- A culpa é tua, disse o príncipezinho, eu não te queria fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...

- Quis, disse a raposa.

- Mas tu vais chorar! Disse o príncipezinho.

- Vou, disse a raposa.



- Então, não sais lucrando nada !

- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.

Depois ela acrescentou :

- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.

Foi o príncipezinho rever as rosas :

- Vós não sois absolutamente iguais a minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela é agora única no mundo.

E as rosas estavam desapontadas.

- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda: Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o para vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.

E voltou, então, à raposa :

- Adeus, disse ele...

- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.

O essencial é invisível para os olhos, repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar.

- Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que fez tua rosa tão importante.

- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... Repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar.

- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...

- Eu sou responsável pela minha rosa... Repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar


MORAL:
Raposas, crianças e rosas vermelhas de todo o mundo, uni-vos!



FONTE DO TXT.:
O PEQUENO PRINCIPE ON LINE