Uma Epígrafe



"...Quanto à poesia, parece condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender."...[Alfredo Bosi, in O Ser e o Tempo da Poesia, p. 133]

sexta-feira, dezembro 12, 2008

Mátria Nº 1 ou minha pátria é minha língua

















Bernardo Soares é um heterônimo pouco conhecido do Fernando Pessoa. Mas são dele as palavras que se seguem mais abaixo e com as quais inicio uma série de postagens carregadas do que chamo de emoção metalinguística.
Ando tomado por um súbito acréscimo de receptividade, algo parecido com aquilo que G. M. Kujawski definia como uma apreensão lírica da realidade. Essa é a razão, creio eu, dessa quase litúrgica atitude ante a Língua Mãe (ou Mátria, como diz Caetano em uma canção).


Leia-se, abaixo, Fernando Pessoa (com a devida reverência):



"Não choro por nada que a vida traga ou leve. Há porém páginas de prosa que me têm feito muito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez, numa selecta, o passo célebre de Vieira sobre o Rei Salomão. "Fabricou Salomão um palácio..." E fui lendo até o fim, trêmulo, confuso; depois rompi em lágrimas felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquele movimento hierático da nossa clara língua majestosa, aquele exprimir das idéias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores ideais -- tudo isso me toldou de instinto como uma grande emoção política. E, disse, chorei; hoje, relembrando, ainda, choro" ... "Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa."


in Fernando Pessoa, o Outro,
Gilberto de Mello Kujawski
São Paulo, s.n.t., 1965, p. 15


A foto é de Orlanda Franco (clique na imagem para ir ao site de origem)
Título: Mesa de Fernando Pessoa, Restaurante Martinho das Arcadas, Lisboa, Portugal – 2004



**********************************

3 comentários:

Sueli Maia (Mai) disse...

E também eu, tenho dupla nacionalidade. Brasileira que tem a Língua portuguesa como pátria-mátria amada.

Sabia que não demorarias sob o selo do silêncio.
Tu, Eurico, és "RICO" e (ai que coisa essa) chancelas a linguagem poética da fina-flor da poesia e dos poetas, nordestinos.

Carinho, sempre.

VIVA!

lula eurico disse...

Ai, menina Mai, se há riqueza em amar os amigos, a terra-mãe e a língua-mátria, esse sou eu. Pois essa é a boa riqueza do na eufonia do "eu-rico". rs
Ainda estou silente.
Em contemplação diante da Língua...

Inês disse...

Simplesmente... emocionante!

Cumprimentos intemporais.